Associação das Emissoras de Radiodifusão do Paraná

Como tirar o melhor proveito de fontes e entrevistas

Por Comunicação. Publicado em 12/03/2021 às 09:42.

Técnicas e cuidados específicos criam condições favoráveis para que interlocutor e fonte ofereçam conteúdo rico e pertinente ao público.

Por Germano Assad


A entrevista é uma das ferramentas mais utilizadas no dia a dia de comunicadores. A depender do formato, e meio de veiculação, existem técnicas e cuidados que ajudam o interlocutor a extrair o melhor do convidado, oferecendo ao público conteúdo rico e condizente com as expectativas criadas.

Em rádio, um dos grandes desafios em entrevistas é administrar o tempo, para intermediar com eficiência e não prejudicar a grade de programação. “O tempo do rádio, em comparação ao da televisão ou internet é diferente, cinco segundos no rádio é muito tempo. Quando você grava ou transmite em vídeo, a fala é apoiada com gestual, cobertura de imagens, já no rádio não tem essa possibilidade, a fala precisa ocupar todos os papéis, do gesto, do documento mostrado, da imagem de arquivo”, explica o âncora e comentarista da CBN Maringá, Gilson Aguiar.

Aguiar entende que a convergência digital está aproximando o rádio da realidade de outros formatos de mídia. “Estamos agregando a imagem ao rádio e isto deve aumentar e se consolidar com o tempo, o que naturalmente vai mudar um pouco a forma que fazemos e conduzimos entrevistas, já que o público vai ver e ler, além de ouvir”, diz.

Apesar do prognóstico, compartilhado por grande parte dos executivos e teóricos do setor, o jornalista destaca a responsabilidade, ainda maior, do comunicador de rádio em contextualizar a entrevista e criar o ambiente para que ela aconteça da forma mais produtiva possível. Além da clareza na fala, escolha de palavras, capacidade descritiva de situações e ambientes e, especialmente, de síntese de ideias.

“Uma das coisas que fui aprendendo com o tempo, e também com alguns ídolos, profissionais com quem trabalhei e sempre gostei de ouvir, como Heródoto Barbeiro e Roberto Nonato, é a compreensão de que precisamos criar o ambiente na cabeça do nosso ouvinte pra ele entender do que estamos falando e com quem estamos falando, aquela ideia de que é preciso dar a dimensão do problema que a gente vai tratar, da questão que a gente vai abordar e entender quem vai falar disso pra gente, para que as pessoas possam localizar aquilo na sua própria cadeia de valores e noção de relevância”.

Ou seja, na hora de buscar um entrevistado e definir um tema, eles têm, necessariamente, que ter relevância para o seu público – o que nem sempre condiz com o que é relevante do seu próprio ponto de vista. Por isso, conhecer a audiência é crucial na hora de planejar entrevistas.

O jornalista entende que, para rádios de cunho mais noticioso, a seleção e a relevância do tema devem sempre preceder a escolha do entrevistado. “Primeira coisa que faço é questionar se o tema é relevante, antes da entrevista ser agendada. O personagem que será entrevistado está sempre dentro do ‘problema’, ou temática do momento, da semana. Raramente, tenho um personagem que vou ‘construir o problema’ para ele participar como entrevistado. A não ser que seja uma personalidade muito importante, que trate de um determinado tema relevante que tenha vários caminhos diferentes que eu possa tratar”.

Tipos de entrevista

Entrevistas podem ter motivações diversas, mas via de regra, se prestam a quatro finalidades, basicamente.

A mais recorrente delas busca esclarecer determinado assunto, atual, relevante e pertinente, até ‘esgotá-lo’, por meio de fonte qualificada, prestando serviço de utilidade pública para a audiência. São os infectologistas falando sobre coronavírus, militares e policiais da reserva ou especialistas em segurança pública explicando os limites da abordagem e uso da força após um caso de repercussão, por exemplo.

Outra forma de entrevista, mais leve, é a focada em bons exemplos, que inspiram, motivam e dão ‘respiro’ à programação noticiosa, geralmente carregada com política, acidentes de trânsito e informações trazidas em primeira mão por repórteres que estão nas ruas, sempre ligados na clássica rádio escuta.

São iniciativas transformadoras, geralmente de cunho social, no mundo das artes, cultura e entretenimento. Projetos inclusivos ou inovadores na área de educação, ou ainda, cases de empreendedorismo e soluções no campo, que envolvem cooperativas e agricultores familiares.

A terceira é quando a posição do entrevistado justifica a entrevista, ainda que não haja um tema atual ou específico a ser explorado. É o caso de autoridades, celebridades e formadores de opinião, gente de difícil acesso, agenda concorrida, personagens que, por si só, já são um acontecimento.

E a última, que melhor representa o papel social do comunicador, é a que dá voz ao cidadão comum. Geralmente, é a denúncia do líder comunitário, da mãe de família que teve o benefício cortado sem explicação, do empresário que sofre achaque e tantas outras possibilidades.

Esta modalidade, ainda que não compreenda o formato mais tradicional de entrevista, é importante para que população e seus representantes se mantenham acessíveis e em contato, já que a falta de comunicação descola cada vez mais a classe política do ‘mundo real’.

Bagagem prática

A coordenadora de jornalismo da Rede Aerp, Juliana Sartori, tem uma lembrança memorável de entrevista, com a qual aprendeu muito. Ambas aconteceram quando apresentava um programa de cultura, na Rádio Lumen FM, de Curitiba, que mesclava apresentações de música com entrevistas, em estúdio improvisado em um shopping da cidade.

Uma delas foi com o cantor e compositor Arnaldo Antunes. “Jamais imaginaria que ele fosse tão tímido quanto de fato é. Conversamos antes, quebramos o gelo, tudo fluiu bem no pré-entrevista. Mas quando entramos no ar, ele ficou monossilábico. Respondia todas as perguntas, abertas ou fechadas, com no máximo duas palavras”. 

Conhecedora do repertório e obra do artista, ela acabou fazendo quase o triplo de perguntas do que havia formulado, para preencher o tempo disponível. “Imagina se não conhecesse bem o trabalho dele, se não tivesse pesquisado curiosidades para explorar o que ele estava mais a vontade de falar?”, questiona.

Gilson Aguiar aponta uma entrevista que fez com o ex-governador e senador Roberto Requião, como a mais tensa de sua carreira. “Ele já vinha de uma série de embates e desentendimentos com outros jornalistas, logo que perdeu a eleição para o senado. Fiz uma pergunta a ele, durante entrevista, sobre o mercado, e problemas de exportação do estado que tinham relação com a gestão do irmão dele no porto de Paranaguá”.

A reação do então candidato, ao final da entrevista, já fora do ar, exigiu muito autocontrole e agilidade de raciocínio do jornalista para contornar o momento de fúria. Com ambas as mãos fechadas em cima da mesa, ignorando o agradecimento do entrevistador, Requião disparou: “você é um desses jornalistazinhos que lê muita revista Veja né”. “E o Sr. acompanha muito pouco o que interessa e só lê o que lhe agrada, não é?” retrucou o âncora.

Controlar a temperatura de entrevistas naturalmente tensas é papel do comunicador, bem como manter o respeito entre as partes, impondo os limites que se fizerem necessários. Afinal, uma pergunta pertinente, feita de maneira educada, não justifica qualquer agressão como resposta, por mais incômoda que seja.

Dicas práticas:

Confira um resumo com as dicas práticas dos jornalistas Gilson Aguiar e Juliana Sartori, para tornar suas entrevistas ainda mais proveitosas:

  • Entrevistados e temas devem ter sinergia com perfil da audiência;
  • Atenção com administração do tempo;
  • Tanto perguntas abertas quanto fechadas são úteis a depender do contexto. É importante saber qual delas usar em cada momento da entrevista, e deixar claro quando se espera tão somente uma afirmativa ou negativa da fonte;
  • Pesquise, consulte pontos de vista diferentes para fazer perguntas relevantes, e para que a entrevista renda conhecimento além do superficial e já sabido;
  • Teste equipamentos, conexão e tudo que dependa de tecnologia para minimizar possíveis falhas técnicas;
  • Reserve um momento pré-entrevista para quebrar o gelo e conversar informalmente com o entrevistado;
  • Procure saber se o entrevistado está habituado com a situação, e explicite o tempo médio da entrevista, para que ele tenha condições de elaborar as respostas de acordo com o tempo disponível;
  • Disponibilize água, sempre;
  • Mantenha a formalidade e o distanciamento da fonte, para que possa questionar sempre com isenção e, quando necessário, assertividade;
  • Capacidade de síntese nas perguntas. Quem tem que elaborar é o entrevistado, nas respostas, e não o mediador;
  • Jogo de cintura e raciocínio rápido para lidar com imprevistos e tomar decisões rápidas;
  • Espírito mediador, e não prevenido. Tampouco agressivo, ou ‘incitador’;
  • Cuidado com o deslumbre e puxa-saquismo;
  • Não julgar, nunca. Nem opinar. O foco da entrevista é sempre o entrevistado;
  • Controle o nível de tensão e imponha limites para si, na insistência em temas que o entrevistado já demonstrou não querer entrar, e para a fonte, caso insista em informações, acusações ou fatos improcedentes.