Em sua última entrevista, jornalista falou sobre o sucesso com a audiência e destacou as características únicas do rádio
Apesar de um começo tardio no rádio, a trajetória do jornalista Ricardo Boechat neste veículo foi brilhante e contribuiu para mudar a forma de comunicação com os ouvintes. Boechat assumiu os microfones da Band News FM quando já tinha uma carreira consolidada na TV e como colunista de sucesso em jornais de grande circulação.
Ele conta como se apaixonou pelo rádio em uma entrevista ao colega de bancada, o jornalista Eduardo Barão. O bate-papo foi divulgado por Barão na última terça-feira (12/02) como forma de homenagear o amigo. O vídeo faz parte do projeto “Barões do Rádio” e está disponível no Youtube (clique aqui para assistir).
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:
O sucesso de audiência alcançado na Band News FM
“A rádio BandNews FM modificou a linguagem e a forma de se relacionar com o público de rádio e começou a subverter determinados conceitos do rádio e do jornalismo. Do rádio, com uma linguagem que sai do campo formal e cai na mais absoluta esculhambação. É como as pessoas são na vida real, ninguém quer ser tão engessando. Nós colocamos isso no ar”.
A relação com o ouvinte
“Outro ponto determinante foi a quebra de alguns paradigmas no jornalismo. O mais inovador foi a inversão do polo da fé pública. O cidadão entrava em contato com a rádio e contava sua versão dos fatos e você submetia essa versão à autoridade da área, que modulava a versão de acordo com a sua conveniência. A imprensa sempre comprou a versão final da autoridade. A gente passou a perceber o seguinte: por que um cidadão comum teria interesse em mentir para uma emissora? Não tem nenhum sentido. E a gente passou a colocar toda a fé pública nesse cidadão. Ele passou a identificar a rádio como um espaço no qual ele se fazia ouvir.
“Eu encontro as pessoas na rua e elas dizem: “Boechat, você falou o que eu gostaria de ter falado. Você fala o que a gente não pode falar”. Todo mundo pode falar hoje em dia. Não tem censura, a internet tá aí e todo mundo pode. Mas essa é uma reação que me gratifica profundamente”.
Dar o telefone no ar
“Eu dou porque acho que é uma forma de dizer para as pessoas que não tem ninguém inalcançável do lado de cá”.
Liberdade jornalística
“Esse ambiente de redação é um ambiente dialético, não tem hierarquia. A hierarquia não funciona no jornalismo da forma como funciona em outros ambientes profissionais. Pressões e contrapressões há”.
A diferença entre o Rádio e a TV
“Eu brinco que no rádio o senhor é o minuto. Na televisão o senhor é o segundo. Um atraso de dez segundos na televisão provoca um efeito cascata na rede maior que o aumento de salário do STF. A televisão não tem essa margem de tempo disponível e você anda com o relógio funcionando como uma espada sob sua cabeça. Na rádio, eu falo pelos cotovelos. Um minutinho leva cinco”.
“Nós não temos a figura do âncora na televisão, o que é uma falha do telejornalismo brasileiro. Nós (que apresentamos os jornais) somos ledores de TP (teleprompter). A reação do público em casa não encontra correspondência na reação daquele cara que não reage. A ideia de reagir e comentar o que vai para o ar é uma ideia da qual eu sou entusiasta. De vez em quando faço isso no Jornal da Band, mas a modelagem ainda é muito engessada”.
Autenticidade e identificação com o ouvinte
“Eu não sou no ar diferente do que eu sou na vida. Cheguei no rádio idoso, com minha vida profissional resolvida e pensei, vou usar o rádio para ser o que eu sou. Olhar para as coisas como eu olho normalmente e reagir normalmente. Não vou construir um personagem. O que me der vontade de falar eu falo. É como se eu me sentisse ali dentro exatamente como eu me sinto em casa ou batendo papo com um amigo. Por alguma razão, ou talvez por essa, as pessoas se identificaram com essa convivência e se sentem íntimos do programa”.
Rádio, um milagre da comunicação
“O rádio do serviço é um pouco o rádio de ontem. Você pega um celular e ele te fala do tempo, tem o indicador de caminhos, tem a temperatura, tem tudo”.
“Eu sei que o serviço ajuda, mas o rádio é tão mais fértil que isso. O diálogo dele é com o coração das pessoas”.
“É engraçado que o rádio – que é algo que não dispõe de cor, imagem, recursos tecnológicos, é só a voz – toque tão de perto as pessoas. A coisa mais ancestral que tem na natureza de qualquer espécie é o som que ela emite. Nós nos comunicamos primeiro dessa maneira, talvez por isso as pessoas se aproximam e se identificam muito”.
“Por isso, o rádio tem que conversar com as pessoas.Tem que contar histórias, tem que permitir que elas sejam contadas. Tem que se igualar e se colocar junto das pessoas no seu dia a dia, no sentimento, que toque o coração das pessoas”.
“O rádio já foi considerado uma mídia morta, mas está aí vivíssimo, crescendo. De todas as mídias eletrônicas, o rádio é a que melhor está enfrentando o advento da internet. O rádio é um milagre compatível com todos os outros milagres da comunicação”.