Associação das Emissoras de Radiodifusão do Paraná

O áudio na vida do deficiente visual

Por Comunicação. Publicado em 18/12/2020 às 11:37.

Meio rádio cativa o público pela natureza inclusiva, ao democratizar acesso à informação e entretenimento.

Por Germano Assad


O último censo divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), com referência em 1º de julho de 2020, contabilizou um total de 211,8 milhões de habitantes vivendo em todo o território nacional. Destes, pelo menos 45 milhões convivem com algum tipo de deficiência – mais de 20% da população.

Neste universo PCD (Pessoas com deficiência), extremamente representativo em todos os aspectos, a deficiência visual é a mais comum entre os brasileiros, e afeta mais de 30 milhões de cidadãos. Gente que trabalha, compra, vende, transita, produz e, sobretudo, se informa, busca entretenimento e consome toda sorte de conteúdo. Por óbvio, no formato de áudio.

A inclusão, que avança lentamente com o apoio de ferramentas tecnológicas, ações de conscientização e mesmo regulatórias, sempre teve os meios de comunicação de massa como aliados na garantia do acesso deste público a direitos fundamentais como educação, informação e lazer.

Para o professor da rede estadual de ensino e diretor do IPC (Instituto Paranaense de Cegos), Ênio Rodrigues da Rosa, leis impositivas em prol da inclusão, que introduziram na televisão recursos como a janela de libras e legenda oculta (closed caption) para auxiliar surdos e a audiodescrição para cegos são legítimas e têm promovido acessibilidade ao longo dos anos. Mas nada incluiu tão rápido quanto a internet, o avanço tecnológico e a empatia por parte de quem produz conteúdo.

“Os dispositivos eletrônicos hoje, quando se compra um celular ou tablet, por exemplo, por mais precário que seja, já vem com alguma acessibilidade, sistema de voz, que te permite fazer a leitura. Se o navegador tem acessibilidade e a maioria tem, é possível ler e consumir aquilo que foi publicado e compartilhado. O problema são fotos e arquivos com extensão de imagem, como os jpeg’s, por exemplo. A depender do aplicativo, até descreve o objeto ou a cena, com características básicas, mas para uma correta leitura é preciso da audiodescrição”, explica.

Neste aspecto, o meio rádio inclui no sentido mais literal da palavra – já que atende à demanda sem qualquer necessidade de adaptação. “Não tem outra maneira de se pôr em contato com pessoas cegas se não pela voz, por isso o rádio é tão encantador para essas pessoas. Porque tem uma comunicação muito própria, é mais descritivo, quem está do outro lado do microfone precisa fazer audiodescrição das coisas e acaba incluindo ao natural. Você incorpora a narrativa que atende na própria comunicação do meio”, reflete.

“Fiel companheiro” de Ênio, especialmente nas jornadas futebolísticas ao longo da vida, o rádio tem experimentado interações com outros meios que, na opinião do professor, acabaram tirando um pouco da habitual prática descritiva por parte de narradores. Com transmissões de partidas ao vivo acompanhadas pela TV e streamings nas redes sociais, o próprio comunicador acaba se ancorando em imagens. “Praticamente te colocavam dentro do campo. Hoje em dia é difícil achar um narrador esportivo de futebol assim, porque fazem uma narrativa sem detalhes”.

O jornalista Henry Xavier, apresentador e plantonista esportivo na Rádio Cidade, de Curitiba, vive a realidade do deficiente visual do outro lado, atrás dos microfones. Com ampla bagagem profissional de radialista, entende que não se deve segregar, já que o meio conversa com todos, ao mesmo tempo, e cada ouvinte tem suas dificuldades e limitações específicas.

“O que passo para as pessoas que trabalham comigo e também procuro fazer é tentar descrever o máximo possível, lógico que você não pode ser tão detalhista com relação à cor, cabelo, essas coisas, porque acaba cansando o telespectador e o ouvinte. Mas o que puder descrever, por exemplo no futebol, o lado do campo que a pessoa está jogando, quem está com a bola, quem está para receber a bola, coisas que passam despercebidas por uma questão de estilo de locução, mas são muito importantes para situar quem tem qualquer tipo de dificuldade para acompanhar é sempre válido”, opina.

Para Xavier, tanto os profissionais da comunicação quanto o público em geral passam a entender estas nuances, e quanta diferença elas fazem na vida de uma parcela tão significativa da população na medida em que convivem com pessoas com alguma dificuldade e que têm acesso a este tipo de informação.

O equilíbrio para comunicar de forma inclusiva, sem exagerar no detalhamento, segundo ele, vem com a experiência, bagagem e principalmente pela curiosidade em entender a realidade alheia. Além da capacidade de se colocar no lugar do outro. “É você se colocar no lugar de quem está em casa, de quem possui uma baixa visão e não consegue ler, de um deficiente visual que precisa saber o que tá acontecendo no entorno. É você ter a empatia e a curiosidade pra saber, e isso vai se tornando corriqueiro e você consegue produzir um material para todas as pessoas sem segregação”.